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A Barata contra o Dragão

Atualizado: 24 de set.



Crok desparafusou a cabeça da Kep-I do chão. Depois de seis horas ela já deveria ter recurso o suficiente para as próximas horas, talvez, em breve, daria para recarregá-la. Lester já estava o acelerando para que pudessem partir daquele lugar. Os pássaros sumiram de repente e isso podia significar pássaros maiores, pássaros motores. De alguma forma aquele lugar não deveria estar tão vazio como aparentava, ele imaginou. Enquanto retornava a cabeça, oval, para a parte frontal do veículo ele se viu olhando para as árvores, imaginando se algum inimigo poderia estar à espreita em uma floresta tão densa.

Assim que encaixou a cabeça, responsável por carregar energia geotérmica do veículo quando parafusada no chão, de volta ao veículo Crok correu para entrar por dentro de uma das asas do exoesqueleto que lembrava um escaravelho do tamanho de uma SUV. Aquele era o veículo que eles chamavam de lar. Sandy já havia recolhido as barracas, fogão e tudo que haviam espalhado pela clareira. Gunna já estava nos fundos testando o sistema de defesa.

Lester mal esperou Crok se acomodar, ligou o veículo e o que seriam as patas daquele escaravelho começaram a rotacionar. Crok, o mais jovem do grupo, logo confirmou que o motor e as armas estavam quase que totalmente carregadas e foi sentar-se no anexo superior, logo acima dos assentos frontais onde Lester , o motorista, e Sandy sentavam.

Ali em cima Crok tinha uma visão privilegiada, via o caminho por cima e ainda tinha boa visão para o céu. Dali ele também controlava o chifre do escaravelho, essencial para ativar a barreira eletromagnética e também usar o chifre como projétil, se necessário. Lester reforçou mais uma vez que Crok deveria ficar atento a qualquer movimentação nos céus.

Lester já havia alertado sobre essa região antes. Era uma região relativamente pacífica, um oásis, mas dominado pelos pássaros. Veículos de pássaros e homens voadores achavam que tinham poder sobre tudo e todos ali então era bom não se meter no caminho deles. Naquela região, longe de qualquer cidade, eles estavam completamente vulneráveis.

Assim que as patas encontraram o chão o Kep-I saiu em disparada entre as árvores e em menos de um minuto Crok já confirmou os temores de Lester. Viu uma sombra no céu, duas asas enormes contrastando com o azul.

  • Veículo alado acima de nós! - Crok alertou imediatamente

Gunna murmurou que as armas estavam preparadas e Lester acelerou ainda mais. Logo Crok avistou as bombas caindo, pequenas esferas caindo do céu na mesma trilha que o inimigo seguia. Antes mesmo do alerta de Crok, Sandy afirmou que as bombas já estavam no radar e passou para Lester as coordenadas para que pudessem se esquivar das explosões. Em segundos, ela já estava alertando Crok para ativar a barreira eletromagnética para evitar os destroços.

Logo o ar estava tomado por fumaça e poeira. O barulho foi ensurdecedor, como se dezenas de trovões estivessem tentando os atingir ao mesmo tempo. Sandy confirmou que o exoesqueleto não havia sido atingido e Lester fez uma curva acentuada à esquerda.

  • Vamos usar a fumaça como distração. - Ele avisou.

Crok entendeu de imediato. Ele iria aproveitar que não podia ser vistos para tomar uma rota alternativa, atravessar o pântano e sair da área úmida à oeste da Montanha dos Cinco Picos. A tensão tomava conta da equipe enquanto eles iam percebendo que Lester pretendia tomar o caminho do pântano, eles já ouviram falar no perigo da região e, recentemente, tiveram problemas contra a Guilda dos Macacos que dominava a entrada e saída da região. 

Sandy tentou argumentar com Lester, talvez aquilo tudo fosse até uma armadilha, afinal os pássaros também dominavam as águas dos pântanos porém ela logo foi silenciada com Lester afirmando que tinha um plano. Afinal de contas, ele era o líder e sempre tinha um plano, todos pensaram em silêncio.

Já Crok, estava um pouco animado com a ideia. Ela havia nascido em Cubana, a maior cidade da região, que emergia sobre as águas em uma região alagada e crescia com madeira impermeável e cipó de forma soberana. A Cidade Cilindro eles diziam, praticamente impossível para os veículos entrarem e onde a movimentação era feita subindo e descendo cipós embebedados com sebo. Uma cidade jovem e pulsante e Crok gostava daquilo. Mas ele sabia que não podia voltar, afinal, estava jurado de morte por lá.

Distraido em seus pensamentos, ele acreditou que o solavanco era fruto do terreno acidentado até que Gunna gritou para que movesse o chifre. A voz dela, estridente, pedia para ajustar o radar no sentido do impacto. Mais impacto, alguma coisa bateu na parte da frente.

  • Estamos perdendo potência - Lester avisou.

  • Fica Tranqui pai, tô com eles no radar. - Gunna disse com um sorriso no rosto.

Do lado de fora, o Kep-I abriu suas asas e mais bombas foram atiradas para cima. Bombas redondas, brilhantes e que caíram exatamente onde estavam os homens-pássaros. Eles não eram necessariamente homens mas eram chamados assim, vestiam asas metálicas e eram os soldados dos veículos alados, eles desciam com uma série de instrumentos destinados a parar sua presa e garantir o sucesso do ataque do veículo.

Assim que subiu a fumaça verde, resultado das explosões das bombas de cobre do Kep-I, Crok viu os homens-pássaros levantando voo. Lester voltou-se para Sandy que entendeu o que ele ia dizer na primeira troca de olhares. Disparou para a porta e logo saiu, tocou nos tênis e deslizou por entre as árvores daquele oásis. 

Sandy era a mais responsável pelo grupo, era sempre ela preparando os detalhes do acampamento, comida, remédios e, em caso de duelos, ela era a ponta de lança do ataque. Deslizando com seus patins anti-gravidade ela era a única capaz de se mover com velocidade em qualquer tipo de ambiente e, com sua pistola de braço, ela podia atirar com precisão nos inimigos.

Como a fumaça já se dispersava, Sandy conseguiu achar os Homens-Pássaros com facilidade no céu, pegou sua pequena esfera elétrica que levava pendurada no cinto e começou a rodá-la com a corda. A esfera era como um ioiô, tinha uma corda enrolada e era ideal para derrubar mais de um adversário em um único lançamento. Sandy girou aquela esfera uma, duas, na terceira ela lançou. A esfera azul, brilhante, ganhou os céus até ser indistinguível para aqueles que estavam no chão. 

Mas, lá no alto, os três homens-pássaros tampouco eram capazes de ver. Olhos fixos no veículo alado, o único refúgio que eles tinham agora que eram perseguidos, eles nem notaram a garota que estava mirando eles. O choque foi total quando a corrente elétrica percorreu o corpo dos três, o tempo pareceu parar enquanto o choque queimava-lhes cada centímetro de seus nervos, o sangue parecia fazer pressão enquanto corria e o coração prestes a explodir. Um deles caiu de imediato, desacordado com a estrutura das asas totalmente inutilizadas, outro caiu alguns metros mas conseguiu recuperar o vôo e saiu para o noroeste com muita fumaça saindo de uma das asas. O último parecia ter sido menos atingido e seguiu voando para cima, mas agora de maneira errante. 

Sandy ainda não tinha desistido de abatê-los, logo que recolheu a esfera elétrica, apontou sua pistola de braço para o céu e atirou, tentando derrubar aquele que resistiu. Logo no primeiro tiro imaginou ter acertado a asa mas sem sucesso. Talvez ela fosse mais resistente do que o imaginava, mirou, então, no corpo, para o segundo disparo. Mais um tiro, e agora viu a mancha de sangue crescer em sua perna. Pensou em tentar mais uma vez, mas ele já estava muito longe.

Logo viu o Kep-I retornando com uma das asas abertas. Sandy entendeu, de imediato, que era para ela retornar, então logo saltou para o veículo. Lester explicou rapidamente que era melhor evitar o conflito. Crok tinha visto o veículo alado indo em direção à região pantanosa portanto iam manter a rota original. Iam seguir margeando o Oásis, evitar o Morro dos cinco picos e atravessariam o deserto rumo à Caverna Azul.

A viagem, de repente, assumiu um silêncio tenso. Sandy e Gunna seguia monitorando os radares enquanto Crok buscava o contato visual. Logo ele visualizou a areia branca do deserto, interminável e notou que eles já estavam no fim do oásis. Seguiram margeando a areia, aparentemente infinita, por algumas horas até que Lester quebrou o silêncio. Nas palavras do líder era melhor se prepararem antes de irem para o deserto, deveriam aproveitar as folhagens e grandes árvores daquele oásis para fazer a última parada uma vez que o deserto era muito aberto.

Todos assentiram com um murmúrio, ainda tensos, e, aos poucos sentiam a tensão se dissipar. Parecia que só agora o terreno acidentado começava a incomodar, principalmente Crok que estava no alto e parecia sentir cada pancada dos movimentos das seis rodas (antes patas) daquele veículo baratóide. Mesmo incômodo ninguém reclamou do Kep-I adentrar ainda mais a mata e cruzar raízes, troncos e pedras em troca de segurança e em pouco mais de uma eles pararam embaixo da raíz de uma árvore gigantes. Ali eles dificilmente seriam vistos de cima e, a essa altura, não dava mais para prever se eles estavam sendo seguidos portanto ninguém se sentia realmente ameaçado em parar.

Sandy rapidamente deixou seu assento, ao lado de Lester, e começou a remexer em alguns compartimentos do veículo, Lester deitou o próprio banco e fechou os olhos em silêncio e Gunna saiu anunciando que ia fazer suas necessidades do lado de fora. Assim que ouviu isso, Crok correu para acompanhá-la.

  • Tá apertado garoto? - a artilheira perguntou de imediato.

  • Na verdade, só estou indo para garantir - ele respondeu.

Logo ele se esquivou e desviou seu caminho para atrás de uma árvore, imaginando que Gunna quisesse alguma privacidade. Logo fez aquilo que tinha que fazer, guardou o que tinha que guardar, saiu do seu esconderijo e logo deu de cara com Gunna o encarando. Parou por um momento imaginando porque ela estava o encarando, será que ela estava espionando esse tempo todo

  • Minha vez garoto, dá licença - Crok balançou a cabeça e logo se afastou. - Não precisa, mas não me deixa aqui sozinha. - Ela completou

Crok obedeceu, esperando ela do lado oposto, sem espiar. Tinha medo do que Gunna seria capaz de fazer se o pegasse bisbilhotando, ele ouviu falar que ela tinha cortado a língua do último homem que tinha tentado puxar assunto com ela na Cidade Mineral. 

  • Garoto - Gunna continuou falando - Você tem certeza que precisamos sair daqui? Do Oásis eu digo.

Pela primeira vez Crok sentiu um tom de preocupação na voz da artilheira. Gunna era sem dúvidas a melhor atiradora que Crok já tinha visto, nunca titubeava nem transparecia qualquer dúvida. Ela tinha uma missão e seguia para esse objetivo não importava o motivo, mesmo que fosse rude às vezes, aquele era o jeito dela. Meio perplexo, meio apreensivo, Crok murmurou alguma coisa, pegou sua faca e tirou um pedaço da casca daquela árvore. Lá dentro os dois encararam a madeira queimada e labaredas ainda saindo do chão, como se tivessem aberto algum portal para o inferno.

  • Vimos o que os lagartos disseram Gunna. Esse oásis está com os dias contatos - Crok constatou resignado - Talvez só sobrem as cidade dos açudes, até o Pântano está condenado.

  • Vocês têm razão, mas eu conheço o deserto Crok. - Ela não o chamou de garoto desta vez. - Lester pode ter tudo planejado mas aquelas areias sempre têm outros planos.

Crok queria rebater. Diria que não seria nem dois dias de viagem até a Caverna Azul e que lá poderia adentrar nas cidades subterrâneas até encontrarem um lugar seguro, ou pelo menos seguro o suficiente para um bando de caçadores de recompensas. Mas reconheceu sua inexperiência, Gunna havia nascido no Deserto e vivia como caçadora há anos, Crok havia se juntado há algumas semanas fugindo das Hienas de Cubana. Portanto ele só abaixou a cabeça concordando com apreensão.

Logo que os dois voltaram viram que Sandy havia espalhado os bancos no interior do veículo e esquentado a comida. Lester já estava com sua tigela na mão e Sandy estava servindo as outras para Crok e Gunna. Alguém disse algo sobre eles terem chegado na hora certa e rapidamente eles comeram e se prepararam para partir.

Assim que ligou o motor do Kep-I, Lester repassou o plano mais uma vez. Seguindo as imagens de satélite que Crok conseguiu, ainda em Cubana, eles viajariam até uma formação rochosa onde passariam a noite, lá estariam seguros das serpentes áridas e de uma eventual tempestade de areia. O clima poderia estar instável então eles deveriam estar atentos aos céus enquanto Sandy monitora o radar meteorológico. Se aquela primeira parte da viagem tivesse sucesso, eles acordariam cedo no dia seguinte rumo à Caverna Azul, uma grande fossa que era a entrada de um grande lençol freático e um dos maiores portos do mundo subterrâneo. Chegando lá eles iriam se misturar à multidão e buscar um novo trabalho ou missão.

Todos soltavam murmúrios de aprovação enquanto Lester citavam seus nomes. O plano era bastante simples com as informações que conseguiram. Era só manter a bússola e todos os aparelhos de controle em ordem, e evitar inimigos, que deveriam chegar em seu destino antes mesmo do pôr do sol. Assim que sentiram a mudança de terreno a tensão tomou conta novamente.

Não pela dificuldade de locomoção, as patas giratórias do Kep-I eram totalmente apropriadas para correr naquelas areias, mas pela exposição que estavam naquele campo aberto. Enquanto no oásis tudo se escondia, no deserto tudo estava exposto em um grande mar dourado que se estendia até onde a vista alcançava. As horas passavam e às vezes era impossível acreditar que a paisagem pudesse mudar, quilômetros e quilômetros de areia, sem um único refúgio em caso de serem atacados, por uma gangue inimigo ou pela natureza. As palavras de Gunna ecoavam na mente de Crok e então ele percebeu que não havia plano B.

À distância, Crok observou por três vezes uma enorme serpente subir e descer daquela imensidão escaldante, em todas elas ele segurou a respiração e ficou alerta mas logo sumiu e não houve aproximação. Na quarta vez, ele imaginou ver outra serpente surgir por detrás de uma nuvem mas nunca teve certeza. Gunna também pediu para todos ficarem alertas por duas vezes, mas o ataque nunca veio. Sandy manteve os olhos nos radares meteorológicos mas nada que tivessem que temer.

Enquanto o céu se alaranjava com o ocaso do sol, logo eles viram as três torres de pedra onde deveriam passar a noite. Crok foi o primeiro a avistá-la, avisou aos outros e foi guiando Lester até que ele pudesse avistar o destino. Em minutos que a ansiedade parecia ter se estendido por horas, eles já estavam no sopé daquele monte de pedras. A versatilidade do Kep-I se mostrou mais uma vez surpreendente ao conseguir escalar aquela parede e logo eles saíram.

Os quatro, assim que saíram do veículo, começaram suas funções sem falar nada. Crok foi para a frente do veículo acoplar a cabeça do Kep no chão para sugar energia, Sandy começava a separar os alimentos e preparar uma fogueira para fazer o jantar, Lester montava as barracas para que dormissem com conforto e Gunna escalava os montes mais altos para instalar radares e armas de defesa. Quando terminaram a lua cheia brilhava de forma esplendorosa, sem nenhuma nuvem no céu. 

Aos poucos, bem alimentados e seguros, eles foram relaxando. As conversas ficaram mais animadas e os risos vinham com facilidade. Gunna contou para eles como o deserto era sempre igual, mesmo nunca estando naquela região, a sensação era de que ela nunca tinha saído dali. Lester se mostrou empolgado para conhecer as cidades subterrâneas, um mundo que ele, mesmo com décadas como caçador, nunca tinha visitado. Sandy estava satisfeita por finalmente ter deixado toda a perseguição para trás, mesmo sendo uma espiã de longa data, ela ainda não gostava dessa vida de caçador de recompensas. E Crok estava feliz somente por estar naquela turma, estava grato por tudo desde o tiraram das ruas alagadas de Cubana e agora sentia ansioso pela sua primeira aventura.

Logo eles começaram a dividir os turnos de vigia. Gunna já havia deixado um centro de controle no alto da maior torre ainda eles teriam uma boa visão e poderiam monitorar (e mirar, se necessário) todos os equipamentos. Gunna iria fazer as primeiras horas assim poderia ajustar os controles, se necessário, Crok faria o segundo turno, Sandy faria o terceiro e Lester ficaria até o amanhecer. Logo todos foram para as barracas para descansar e Gunna assumiu sua posição.

Logo o cansaço de todo aquele dia bateu e não demorou para que caíssem no sono, cada um em sua barraca enquanto Gunna continuava sob o céu estrelado observando milhares de tela para garantir que tudo estava na mais perfeita ordem. Movimentou as três artilharias móveis que tinha deixado nos montes de pedra só para garantir que estavam voando e roteirizou o caminho dos dois drones de monitoramento que tinham. Assim acreditava que tinha tudo sob controle. 

Nas horas que ainda restavam, só restou a ela relembrar como o deserto era um lugar onde a vida se espalhava mesmo que tudo parecesse morto. Viu pequenos animais (de verdade, não veicularizados) saírem de suas tocas escondidas no subsolo; viu lagartos escavarem cactos, flores e outras plantas para comer; até mesmo pássaros de outras regiões se juntaram aquela grande dança pela sobrevivência em sua caça diária. Tudo isso iluminado pelo céu mais brilhante de todo mundo e, ela sabia, que nem precisaria visitar todo o mundo para ter certeza disso.

Mesmo acordada Gunna não poderia estar mais relaxada, parecia sonhar com os dias que era só mais uma combatente nas esquadras das serpentes áridas, só mais uma dentro daquele veículo de centenas de metros todo envolto em canhões. Ali ela fez amizades, aprendeu a ser a melhor atiradora que podia, tinha defendido o pluralismo do deserto até às últimas consequências, até o dia do motim. Ela não sabia bem os motivos daquele motim, mas ela nunca apontaria o canhão para suas amigas como queria o alto comando. Alguns líderes diziam que os Dragões de Ouro queriam enfraquecer o deserto mas Gunna jamais abriria mão de suas amigas. Foi assim que abandonou o exército, vagou por grupos mercenários até encontrar Lester e Sandy enquanto ia procurar por alguma missão na Cordilheira Enegrecida, os barões do carvão estavam cheios de ouro naqueles tempos. Lester e Sandy, até mesmo o jovem Crok, Gunna sabia que jamais poderia abandoná-los.

Perdida em pensamentos, chegou a se assustar por um momento quando ouviu Crok subindo a escada de corda que ela tinha montado ali. Logo viu o garoto chegar, alguns minutos antes do planejado.

  • Está desperdiçando sono garoto. - Ela provocou.

Crok desconversou e disse que já tinha perdido o sono. Comentou que estava um pouco ansioso para conhecer as cidades subterrâneas. Gunna riu dele, disse que todos estavam um pouco ansiosos. Ela ainda explicou rapidamente como funcionava todos aqueles apetrechos, mas sabia que podia confiar em Crok, ele lidava bem com tecnologia.

Desta vez era o garoto que acompanhava a orquestra daquele bioma, a movimentação dos animais noturnos, insetos luminosos se movendo e as dunas que se moviam como ondas no mar sob a luz prateada do luar. O garoto estava maravilhado, mas ao mesmo tempo sentia que não conseguia aproveitar tudo pois precisava estar atento aos perigos. Por fim decidiu que, mesmo se tivesse total atenção, precisaria de anos naquele ambiente, que julgava morto, para registrar tudo. O deserto vivia e isso era quase assustador para a vigília de Crok.

Foi só naquele momento que ele percebeu como o mundo que conhecia era pequeno. Crok adorava a cidade de Cubana, tinha crescido ali e achava maravilhoso como ela se erguia das águas, mas aquele deserto, azul e prateado até onde a vista alcançava, onde até o vento poderia ser visto. Parecia loucura que eles tentassem atravessar aquilo tudo na surdina, mas cá estavam eles. Toda a tropa escondida, tal qual milhares de outros seres vivos escondidos sob aquele manto de areia. O deserto era fascinante, tão fascinante quanto o oásis verdejante e isso era maravilhoso.

Sandy parecia ter chegado mais cedo que o combinado, mesmo sem nenhum perigo a sentinela esteve longe de ser entediante, mas já era hora de passar o bastão para Sandy assumir. Crok ainda quis saber se ele era o único maravilhado com aquela paisagem e Sandy sorriu e começou a lhe dizer como o mundo era grande.

Ela já havia vivido nas maiores cidades do mundo conhecido, conhecia florestas, desertos, montanhas e até o subterrâneo. Nos seus tempos como espiã dos Dragões de Ouro ela viajou todo o mundo, se camuflou nas mais diferentes culturas e manteve as riquezas dos dragões intacta no subterrâneo do planeta. Ela disse como ele tinha uma vida de luxo, conhecimento infinito e que conhecer paisagens como aquela era corriqueiro viajando nos gigantescos veículos dracônicos. Mas ela também disse que nada disso superava o que ela tinha agora, um grupo de amigos que eram mais que amigos, eram sua família. Ela trocaria todo esse período de ostentação pelos quatro integrantes do KEP-I.

E com essa reflexão Crok foi dormir. Deixou Sandy terminar a vigília e estava empolgado com o mundo que iria conhecer no dia seguinte.

Entrou em sua barraca abafada, fechou os olhos e apagou mais rápido que o esperado. Porém, no meio de seu sonho enquanto visitava mundos inexplorados, foi acordado com uma explosão. Sentiu o mundo caindo em cima de si e desmaiou novamente. Não sabia o que estava acontecendo e logo estava inconsciente.

Crok acordou cercado por paredes pichadas, sentiu que o ar não era o mesmo, ardente, do deserto, sentiu suas mãos amarradas atrás das costas mas mesmo assim tentou se levantar. Na mesma hora sentiu alguma coisa puxar ele para trás, apertou os olhos e viu um homenzinho de olhos muito grandes e uma gola que fazia com que ele parecesse um lagarto.

  • Então você que é o garoto esperto o suficiente para hackear um satélite, não é mesmo. Deveria ser esperto para saber que não dá para se livrar tão fácil.

  • O que você quer dizer?

  • Estávamos perseguindo vocês desde o oásis. Sandy já conhece nossos métodos, ela deveria saber que não é tão fácil assim chegar nos domínios dos dragões.

Neste momento Crok se apavorou, procurava por seus amigos mas não os via. Não sabia onde estava e nem tinha vestígios da Kep-I. O homenzinho riu com sua longa língua para fora da boca e disse que Crok não deveria se preocupar pois seus amigos tinham muitos talentos. Ele também explicou que os dragões de ouro estavam furiosos com eles por tentarem invadir o mundo subterrâneo.

  • Ninguém rouba o ouro de um dragão. - ele gritava - Eles são homens divinos que merecem toda a riqueza deste mundo!

Crok não sabia bem o que ele queria dizer mas ficava difícil discordar com as mãos amarradas. A única coisa que ressoava na sua mente era aquele homem falando que ele tinha amigos talentosos. Viu uma serpente árida subir da areia e sonhou, por um momento com Gunna, disparando um tiro dali. Sandy o resgataria com seus sapatos deslizantes e logo eles estariam salvos em Kep-I pilotada pelo Lester.

Imagina só, vocês, um grupinho de baratas desafiar a riqueza e o poder DE UM DRAGÃO! - O homenzinho seguia gritando.

Crok queria retrucar, baratas não morriam, nunca morriam e eles eram a prova disso. Cada um sobrevivera à sua própria tragédia mas sobrevivera. Todos eram baratas mas não eram fracos, eram fortes e suportavam muito mais peso do que poderiam imaginar. Suportavam e carregavam, às vezes sozinhos mas, se possível juntos. Agora estava sozinho mas Crok sabia que era uma barata como os outros e precisava sobreviver. Sentiu as algemas apertando seus pulsos, contou a respiração três vezes, rezou por uma ajuda que nunca veio e resignou-se. Precisava sobreviver. Concordou com o que o homenzinho dizia, os dragões estavam procurando um hacker de talento, lógico. Concordou em se juntar ao exército draconiano. Seus amigos tinham talento, ele precisava sobreviver


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